sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Plínio Sampaio exalta "valores socialistas" e critica Marina


Por Camila Souza Ramos [Quinta-Feira, 15 de Outubro de 2009 às 17:59hs]

Há algumas semanas, um grupo de intelectuais assinou um manifesto a favor da candidatura de Plínio de Arruda Sampaio para a presidência da República, criticando a polarização PT-PSDB e tentando barrar as tentativas de composição do PSOL com a candidatura de Marina Silva, que ganharam força diante da hesitação de Heloísa Helena em assumir uma nova candidatura presidencial.

Sampaio afirma que "se for do desejo do partido fazer uma campanha mais nítida, apelando mais para os valores do socialismo, acho que tenho condições de aceitar essa tarefa". Segundo ele, a candidatura de Heloísa oferece propostas mais imediatas e tem “uma preocupação muito grande com o aspecto da moralidade pública”.

Sobre Marina Silva, Sampaio faz a ressalva: "enquanto não se criticar a partir de uma postura anticapitalista o regime vigente, o discurso ambiental é um discurso técnico, sem fundamentação política nenhuma". Sampaio também fala sobre os ataques da mídia contra o MST. Leia abaixo a entrevista concedida à Fórum.

Fórum - O senhor vai levar adiante sua pré-candidatura? Isso já foi discutido dentro do PSOL?
Plínio de Arruda Sampaio - Um grupo de companheiros levantou minha candidatura, porque acha que tenho condições de fazer uma proposta que questione mais diretamente o regime capitalista, que seja capaz ir um pouco além apenas das medidas concretas. É para lançar ao povo um questionamento, uma dúvida, que é a seguinte: não haverá uma alternativa mais correta para a solução dos problemas do povo brasileiro?
Outros companheiros do partido entendem que não, que é preciso ir diretamente nos problemas que estão atormentando a população hoje e com soluções viáveis, mesmo que elas representem uma pequena melhoria, que são importantes, porque melhoram a vida do povo agora. As outras medidas também são para melhorar a vida do povo agora, são concretas, mas são medidas mais difíceis de serem conseguidas porque são mais radicais. Esse é o dilema que vive o partido hoje. Por isso alguns companheiros levantaram a minha candidatura. Perguntaram se eu concordava que levassem meu nome (pra candidato à presidência), e concordei. Se for do desejo do partido fazer uma campanha mais nítida, apelando mais para os valores do socialismo, sem esquecer as medidas concretas aplicáveis agora, acho que tenho condições de aceitar essa tarefa.

Fórum - A candidatura da Heloísa Helena, como tem ocorrido, seria essa candidatura para resolver problemas mais imediatos?
Sampaio - Ela é uma figura das discussões dos problemas de hoje, com uma preocupação muito grande com o aspecto da moralidade pública. É o discurso dela. E tem vários companheiros que acham que esse é o discurso correto.

Fórum - Caso não entre em um acordo entre os nomes, existe a possibilidade de aliança com algum partido?
Sampaio - Há vários companheiros que propõem a Marina (Silva). O partido esta fazendo uma grande discussão sobre esse assunto.

Fórum - Qual sua visão a respeito da aliança com Marina?
Sampaio - Não. Eu tenho problemas com a Marina pelo seguinte: embora a Marina seja uma candidata muito melhor do os que estão circulando por aí. Mas a posição dela em relação ao problema do meio ambiente é uma posição insustentável. Enquanto não se criticar a partir de uma postura anticapitalista o regime vigente, o discurso ambiental é um discurso técnico, sem fundamentação política nenhuma. É essa falta de sustentação que explica as derrotas políticas dela enquanto ministra. Não quer dizer que tendo um poder maior como presidente do pais ela consiga superar isso, porque se trata de uma questão de correlação de forças. De modo que, ou ela faz uma campanha que muda a correlação de forças ou, como presidente, vai ter que engolir os mesmos sapos que engoliu como ministra. Por isso eu me oporia a essa aliança.

Fórum - Nas últimas eleições, o PSOL do Rio Grande do Sul aceitou financiamento da Gerdau. O senhor é a favor desse financiamento privado?
Sampaio - Não, sou absolutamente contra. Nós não podemos aceitar dinheiro da burguesia, nós somos contra a burguesia. Por que ela nos daria dinheiro? Estamos fazendo uma campanha muito mais pobre, e temos que financiar a campanha com recursos próprios, junto ao povo.

Fórum - Essa diferença de opinião pode causar uma divisão mais séria no partido?
Sampaio - Não. Todo partido é dividido entre muitas opiniões, e não estou vendo nenhum indicador de racha ou de divisão muito forte. Está havendo um embate político normal.

Fórum - O senhor acha que as acusações de setores políticos e os ataques da imprensa contra o MST tem se intensificado recentemente?
Sampaio - São investidas periódicas. Há uma coisa meio cíclica. Nós estamos em meio a uma ofensiva fortíssima da direita e da mídia da direita. O motivo que eu vejo é que tem já um palanque para a posição dos candidatos, já estão preparando o palanque para 2010. E isso tem um pouco de reflexo das contradições internas no seio da burguesia agrária, que está sendo esmagado pelo grande agronegócio. Ela está ficando meio ensanduichado entre a pequena agricultura e o grande capital, avassalador. Esse setor, que é de grandes proprietários, não quer ouvir falar em mudança da propriedade ou qualquer coisa que possa desapropriar.

Fórum - Como o senhor vê a revisão dos índices de produtividade da terra?
Sampaio - Estive na terça-feira, 13, depondo no congresso do Senado a respeito desse assunto. Várias coisas precisam se esclarecidas. Primeiro, não há aumento de índice, há uma atualização. Os índices atuais baseiam-se nas estatísticas de 1975, e elas mediam a produtividade média da agricultura brasileira naquele tempo, com o nível de tecnologia daquele tempo. Hoje essa tecnologia está mais avançada. A lei agrária determina que, periodicamente, esse índice seja reajustado ao grau da tecnologia atual. O que esta havendo simplesmente é um reajuste, mais ou menos como o reajuste da inflação pra moeda. Não mudou o valor. Não tem que ter aumento real do índice, esse problema não está em jogo. O problema é o seguinte: precisa usar 80% da terra. Na terra que é usada, precisa ter uma quantidade de produto por hectare igual à média da quantidade produzida por hectare da mesma micro-região. Se estiver abaixo da média, é porque é um agricultor incompetente, portanto não está usando bem a terra e não está cumprindo a função social da propriedade rural, que consta em artigo da Constituição. Então não é caso de aumentar ou diminuir o índice. O problema é: quantas toneladas de milho é a média que se colhe hoje? É a mesma que se produzia em 1975? Não, é três vezes maior. Portanto, quem estiver produzindo igual àaquela época, está atrás da média de sua região, é um agricultor atrasado e não deve ter propriedade agrária porque não está capacitado para isso.

Fórum - Só a produtividade é parâmetro para questionar os latifúndios? Por exemplo, o senhor considera legítima a ocupação da fazenda da Cutrale, que tem alto índice de produtividade?
Sampaio - O problema é que a terra não é da Cutrale, é do governo e (a empresa) está irregularmente lá. Essa terra é uma terra pública, e portanto uma terra da reforma agrária. Os fatos ocorridos na fazenda São Henrique é uma forma que o MST encontrou de furar o bloqueio da imprensa, que não explica pra população que essa terra não é dos proprietários, é do governo, e deveria estar sendo usado pra fazer assentamentos da reforma agrária. Como o movimento não consegue vencer o bloqueio da imprensa, da justiça nem a inércia dos governos, porque o Lula não aperta os grandes produtores, resolveram contar isso pra população e usou esse método. Mas aqui nesse país, a coisa é assim: o substantivo não tem a menor importância, o que importa é o adjetivo. Ninguém vai atrás do que aconteceu, mas de como aconteceu. O drama do MST é o drama que Ruy Barbosa falava em 1924, sobre a reforma da Constituição. Ele dizia que é muito engraçada a consciência da nossa burguesia, porque, pensa-se, se o povo está quieto, porque você vai reformar a Constituição se o povo não quer? E se o povo se levanta, sai pra rua e reivindica que mude a Constituição, a burguesia fala: “como você pode mudar a Constituição com o povo sublevado?” Então não muda nunca. O MST não tem muita alternativa senão fazer o que está fazendo.

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