quinta-feira, 21 de maio de 2009

"Eu sou revolucionário!"

O quê basta para “ser revolucionário”? Uma convicta afirmação de princípios? Uma citação proverbial e descontextualizada de Marx? Um livro clássico de Lênin embaixo do braço?


Certamente a resolução da questão não se encaminha, ao que podemos chamar, no “nível da consciência”. Sim, Marx, pelo menos desde A Ideologia Alemã, trata de desvencilhar a consciência humana da ação humana. Separação já presente em Hegel – para Hegel a consciência ocupa um lugar mínimo na história, o que importa é a “astúcia da razão” (List der Vernunft) que se realiza a despeito da consciência dos agentes; pouco importa se Napoleão pensava apenas em sua glória pessoal ou se seu objetivo era a extensão dos ideais burgueses, importam seus atos –, Marx a aprofunda, trazendo como instância última a materialidade, a ação ao invés da intenção.


É isso que inclusive permite que Marx articule o conceito de “ideologia”: um déficit entre a consciência do mundo e a sua apreensão correta. O próprio déficit resultado de um processo histórico de divisão do trabalho, que afastando a classe dominante da esfera do trabalho deforma sua consciência – processo análogo à dialética do senhor e escravo na Fenomenologia do Espírito de Hegel.


Mais que em Hegel, no entanto, em Marx a consciência ocupa um papel importante. Se para Hegel uma revolução é a realização da “astúcia da razão”, em Marx, a revolução que importa – a revolução proletária –, é feita sob o conhecimento verdadeiro do mundo. Se Robespierre e Danton pensavam estar instaurando a igualdade, a liberdade e a fraternidade quando na verdade lançavam as bases ao domínio da burguesia, o revolucionário marxista tem de possuir uma consciência muito mais apurada dos seus atos – em suma, consciência e realidade devem se tornar um só, sujeito e objeto devem coincidir.


Mesmo assim, em geral, a consciência para o marxismo é apenas um momento do real – e dos mais abstratos. O que importa é a ação no mundo, esse é o único critério para medir a adequação entre discurso e realidade. Não vamos problematizar o fundo histórico disso – os bolcheviques tinham realmente consciência da revolução que faziam? –, apenas queremos notar que não basta declarar-se revolucionário, é preciso algo mais.


Pensamos a esse respeito nas pequenas seitas políticas que se digladiam entre si – mas não apenas nelas. Cada uma acusando a outra de “reformismo”, “capitulação” etc. Certamente a fidelidade ao Programa de Transição não pode ser o critério para essa espécie de acusação.


E o contrário? Àqueles grupos que ainda se encontram no espectro do centro ou da direita que imaginam estar construindo uma revolução? Lógico que há de se desvincular socialismo e revolução – depois dos Estados de Bem-Estar, os nórdicos mais, o francês menos, isso fica muito claro. Se todo revolucionário – os que tratamos no texto, pelo menos – é socialista, a mútua implicação é falsa.


Quando um grupo, seja qual for, participa de uma organização e pensa ser revolucionário, com suas estantes repletas de Engels e Bukharin, seus documentos principistas declarando a meta estratégica do socialismo, e faz concessões, em vista da sua autopreservação ou em vista dos aparelhos obtidos por meio da institucionalidade, esse grupo é revolucionário?


A tensa dialética entre institucionalidade e movimento é, talvez, uma das mais interessantes para compreender a degeneração de organizações que em sua gênese eram genuinamente revolucionárias. A marcha pelo interior das instituições, “acumulando para a revolução”, muitas vezes não passa de ser o coveiro dela. Rosa Luxemburgo acusava o Partido Social-Democrata Alemão (à época os comunistas) de o socialismo ser apenas uma palavra para os dias de festa – a “festa” indica a acomodação à ordem, uma diminuição do caráter ilegal do partido.


A lição mais geral é que mesmo os revolucionários – ou que se pretendem como tais – se enganam. Simples assim. A consciência do pretenso marxista é também determinada, mais que pelos seus desejos moralmente vagos de socialismo, pela materialidade, cuja forma mais perigosa é a institucionalidade. Quantos foram os “revolucionários” que pediram calma quando era possível avançar? Quantos legitimaram suas ações em uma teoria esquizofrênica, lançada mão ad hoc, e provaram por a + b que o último governante de plantão representa o máximo da correlação de forças e, como tal, é necessário reconhecer-lhe a legitimidade?


A desconfiança com os fatos da consciência é salutar ao revolucionário. Isso porque a preocupação do revolucionário é antes de tudo com a verdade – e não com uma justificação qualquer de um peleguismo de última hora. “Eu sou revolucionário!” é uma daquelas frases que dizem mais no que pressupõe do que no que expressa. Daí minha desconfiança com os “revolucionários” – principalmente se em seguida da autoproclamação vier um pedido pela não ocupação de uma prefeitura.

3 comentários:

Alberto Ferreira disse...

Fala Hernandez.
Sobre revolucionários dá uma lida em:

http://degustandomemorias.blogspot.com/2009/04/os-meninos-revolucionarios.html

Só para relaxar um pouco antes do ato de amanhã.
[]s

Unknown disse...

Eu sou revolucionário. ..porque revolução tem vários tipos..quando Vc para de beber. .quando se torna um filho melhor..não usa drogas do sistema..se torna um pai melhor..isso é revolução...tem vários tipos de revolução

Unknown disse...

Eu sou revolucionário. ..porque revolução tem vários tipos..quando Vc para de beber. .quando se torna um filho melhor..não usa drogas do sistema..se torna um pai melhor..isso é revolução...tem vários tipos de revolução