sábado, 23 de agosto de 2008

Uma nota sobre as eleições em Joinville – O (não)preenchimento de um vácuo

A falência de uma significativa parcela da Esquerda é notória. A integração do PT – vinte cinco anos de efetiva organização de classe implodida por um processo brutal de desindustrialização, terceirização e venda barata do Estado brasileiro – criou um vácuo político que ainda espera sujeitos capazes de preenche-lo. Muito embora iniciativas importantes como a Frente de Esquerda (PSOL, PSTU e PCB) em 2006 e sua precária repetição em 2008, um diagnóstico realista, fundado em um pessimismo da razão como indicado pelo sardo Gramsci, tem de admitir que a propalada “reorganização da Esquerda” é um feito mais imaginário que observável.

O “deserto neoliberal” ou o “desmanche” – duas fiéis imagens de um Brasil contemporâneo – perduram, reproduzem-se e demandam soluções, no entanto. Se a inexistência de um intelectual coletivo vigoroso – leia-se, um partido político de esquerda – impede a produção de discursos sobre a sociedade de maneira exitosa, o vazio é preenchido por outros discursos/sujeitos. Daí o salto dessa nota: Joinville, Esquerda destroçada e estofo “trabalhista”.

Em Joinville, durante duas décadas pelo menos, o PT foi capaz de representar – representar em um sentido preciso: ligar interesses de classe à organização política – os oprimidos e esquecidos dessa cidade. O movimento nacional de transformismo do PT atingiu da mesma maneira o PT joinvilense. Ao invés das assembléias de bairro, a nova sede do PT é a Associação Comercial e Industrial de Joinville (ACIJ). Em meio aos destroços, cabe observar quem vai tentar ligar os fios entre trabalhadores e representação, e a isso é fácil notar que se trata de Rodrigo Bornholdt.

O candidato Bornholdt retoma além de pautas tradicionais – Passe Livre, participação popular – todo um vocabulário consagrado pela Esquerda, como a palavra – a essa altura, mais que esconjurada – “revolução”. Os tons, todavia, são bem mais amenos que, por exemplo, o trabalhismo de Jango ou o PT de 1980, mas ressignificam, com alguma força, idéias construídas durante décadas, cujo patrimônio é, via-de-regra, relacionado à Esquerda.

Evidente que a candidatura não se reduz a reocupar locais desocupados – os próprios lugares depois de quase duas décadas de neoliberalismo não são os mesmos –, mas as idéias dão cores próximas àquelas tradicionais. A ligação com o Ministro do Trabalho Carlos Luppi (PDT), ex-ferrenho opositor do PT e sucessor opaco de Brizola, junto a um partido ligado historicamente aos trabalhadores mostram o interesse na conquista de votos operários.

Se o empresariado “esclarecido” apóia Carlito Merss, como o mais capaz de trazer os benefícios do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), o empresariado mais “tradicional” prefere a segurança com Darci de Matos e Kennedy galvaniza os votos do público evangélico, Rodrigo Bornholdt tenta substituir o lugar ocupado um dia pelo PT e aparecer como a alternativa de Esquerda nas eleições, somado a figura jovem e relacionada à Cultura.

O discurso de Rodrigo Bornholdt, porém, mostra com alguma clareza a indeterminação entre classe e representação. As referências vagas a uma dita “revolução” – que parece mais próxima de seu sentido astronômico, isto é, uma volta total ao mesmo ponto – somadas a uma austera idéia de universalização do transporte aos estudantes e a ligação eventual e inorgânica com qualquer tipo de movimento organizado que não dentro de estritos limites pedetistas traduzem, na verdade, a improvável realização de qualquer projeto genuinamente de Esquerda.

A impossibilidade de se ligar aos trabalhadores implicará em um discurso que tende a flutuar e cair no nada, isto é, na política mais convencional possível, cujas alusões ficarão circunscritas a – agora domesticada – palavra “revolução”.

Nenhum comentário: